Palavras-chave: arte; psicanálise; política; utopia; território
Participação: on-line
Inspirada pela obra Future Scenarios dos artistas visuais Lena Dobrowolska & Teo Ormond-Skeaping, buscarei colocar em análise a dimensão política e utópica da arte. Através de uma composição entre vídeos, fotografias e narrativas, ambientados sobretudo em três realidades distintas: Uganda, Bangladesh e Londres, envolve questões ambientais e políticas. Imagens de um passado recente (2017 e 2018), que integram uma narrativa ficcional de um futuro dos próximos 81 anos. Vidas que seguem em contextos muito distintos, reflexos distantes dos efeitos da sociedade de consumo. No jogo de colocar lado a lado realidades tão dispares e tão próximas, na tentativa de trazer o humano para o centro da cena, revelam a angústia ante a nossa impotência. Mas a proposta de cenários futuros faz um giro, pois podemos, em uma dimensão micropolítica, constituir no presente, esperanças no amanhã.
Tendo a psicanálise como base, essa reflexão vai em busca das singularidades e dos significantes que se destacam como pontos nodais da obra. Cultura, valor, território e fronteiras são elementos que permitem analisar a dialética colocada em cena. Em um jogo entre passado, presente e futuro, os artistas criam uma ficção poética e possibilitam transitar entre diferentes tempos. Assinalam a repetição que o futuro acena, mas também interrogam o adormecimento presente ante a catástrofe ecológica e social que se agrava. Realidades invisibilizadas são postas lado a lado com aquelas que mostram a dinâmica do desenvolvimento capitalista e, assim, aprofundam a função crítica e utópica da arte. Abordarei essa análise em dois eixos: arte política e utopia.
A política, como bem analisa Jacques Ranciére (2005), em sua dimensão de partilha do sensível, refere-se aos modos como cada um ocupa-se do laço social, com suas contribuições singulares por aquilo que faz. Nesse sentido, toda a arte é política, mas algumas obras acentuam essa dimensão, ao ter como tema o próprio laço social. Nesse gesto, reflete-se sobre uma dupla perspectiva utópica da obra: uma leitura crítica que ela faz de seu tempo e um novo traço que inscreve na cultura. Leitura de uma realidade, das relações que se estabelecem, demarcação de uma perspectiva política, de um viés de leitura do sensível e ao mesmo tempo um novo objeto que conta, mostra e sonha com uma realidade, mas que não prevê ideais, apresentando-se como enigma. Coloco em questão, dessa forma, a política e os enigmas que Future Scenarios indica.
DIDI-HUBERMAN, Georges. A semelhança informe: ou o gaio saber
visual segundo Georges Bataille, Rio de Janeiro, Contraponto,
2015.
_________. O que Vemos, o que nos Olha, São Paulo, Ed 34, 1998.
_________. Diante do Tempo: Historia da arte e anacronismo das
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RANCIÈRE, Jacques. A Partilha do Sensível: Estética e Política,
São Paulo, Ed. 34, 2005.
SOUSA, Edson Luiz André de. Por uma Cultura da Utopia, In:
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Ana Lúcia Mandelli de Marsillac Psicóloga, Psicanalista, Professora Adjunta do Departamento e do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA). Coordenadora do Grupo de Pesquisa: Laboratório de Psicanálise, Processos Criativos e Interações Políticas (LAPCIP) e coordenadora do Projeto de Extensão: Acompanhamento Terapêutico: clínica e criação na cidade - UFSC. Bolsista PQ do CNPq. Mestre em Psicologia Social e Institucional – UFRGS, Dra. em Artes Visuais: história, teoria e crítica – UFRGS, Pós-doutora pela Universidade Nova de Lisboa. Tem publicações em periódicos e livros nos campos da psicanálise, saúde mental e na interface entre arte e psicanálise. Autora do livro: Aberturas Utópicas: arte, política e psicanálise, ed. Appris, 2018.