Palavras-chave: Colonialismo científico; Narrativa visual; Fotografia colonial; Visibilidade/invisibilidade
Participação: presencial
A relação entre a prática fotográfica, a História e a criação do conhecimento científico é duradoura, porém, conturbada: marcada, tanto por discursos descredibilizadores da fotografia enquanto fonte e ferramenta legítima para a compreensão e interpretação da realidade, como por períodos de afirmação e legitimação da linguagem imagética. Independentemente da perspetiva adotada, importa ter em conta a subjetividade inerente ao processo de criação do conhecimento histórico, na medida em que resulta de uma realidade contínua de interpretações, incluíndo as de quem o produz.
Neste sentido, a proposta de comunicação que apresentamos a esta Conferência Internacional visa problematizar, através de uma abordagem ao arquivo fotográfico, o processo de construção de verdade das fotografias oficiais da Diamang (Companhia de Diamantes de Angola). Este trabalho resulta de um trabalho conjunto acerca do tema que vimos desenvolvendo. Assim, a presente proposta pretende contribuir para o questionamento em torno da produção fotográfica colonial com fins propagandísticos, nomeadamente, na forma como a fotografia era aplicada, pela Diamang, como instrumento de controlo e dominação do território e das suas populações.
Ao contrário do que se verificava na fotografia colonial coetânea, a fotografia oficial da Companhia não denotava o universo africano tal como os europeus o reconheciam (a estranheza, o exotismo ou a animalidade do outro), porque pretendia propagandear o culto do trabalho e a designada ‘missão civilizadora’ sob a égide do ‘colonialismo científico’, de forma a afirmar e legitimar a ação colonizadora da Diamang.
A ‘ocupação científica colonial’ desenvolvia-se sob uma corrente positivista associada à crença na objetividade e transparência da fotografia: esta revelaria o mundo tal como ele é; este princípio orientador permitiu, por um lado, recriar cenários e captar imagens que refletissem a realidade pretendida pela Companhia mas, por outro, implicou o estabelecimento de uma série de restrições associadas à posse da máquina fotográfica: apenas os fotógrafos oficiais da Companhia estavam autorizados a fotografar em toda a área administrativa e o acesso às fotografias oficiais era vedado a toda a população: o outro era sempre objeto, mais um elemento da paisagem, um veículo propagandístico.
A questão em debate permite desmistificar o papel da fotografia enquanto instrumento político de orientação e disciplina, à luz de dicotomias como visibilidade/invisibilidade, conotação/denotação e imaginário/realidade.
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Bruno Madeira. Professor convidado equiparado a auxiliar no
Departamento de História do Instituto de Ciências Sociais da
Universidade do Minho e no Departamento de História e de Estudos
Políticos e Internacionais da FLUP. Investigador integrado no
Centro de Investigação Transdisciplinar "Cultura, Espaço e
Memória" da Universidade do Porto. Doutorado em História pela
Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) com a tese
«Homens entre ruínas»? Ideias, narrativas, mundividências e
representações das direitas radicais portuguesas (1974-1985).
Filipa Rodrigues. Licenciada em Turismo, Território e Patrimónios
pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Aluna do 2.º
ano do Mestrado em Património Cultural do Instituto de Ciências
Sociais da Universidade do Minho, estando a realizar uma
dissertação intitulada ‘Entre a Terra e o Mar’: Etnografia visual
da cultura do sargaço na comunidade piscatória de Angeiras,
Matosinhos.